A idade divina para a bênção de todos
Louis Claude de Saint Martin



Quando a grande época da salvação chegou, o verdadeiro espírito de sacrifício adquiriu uma extensão ainda maior; não era mais limitado, como na primeira idade espiritual, ao progresso de um povo particular e nem aos meros alertas dados às nações, como no tempo dos profetas; ela abarcou toda a família humana, impulsionando todas as coisas em direção ao cumprimento da promessa feita por Abraão, nele todos deveriam ser abençoados.
A grande época divina do Redentor recolocou o Homem no caminho da verdadeira recuperação e lhe deu os meios de libertar os escravos (com ele) da casa da servidão, manifestando a todos os planos e a toda ordem de coisas a Glória, Justiça e Poder do Ser Supremo cujo selo e caráter foram investidos no Homem pelo Santo Redentor.


Vemos aqui o verdadeiro significado da palavras dirigidas a Jeremias (I.10): "Vê: dou-te hoje poder sobre as nações e sobre os reinos para arrancares e demolires, para arruinares e destruíres, para edificares e plantares", pois Jeremias era um profeta designado apenas para os reinos terrestres enquanto que o reino de Cristo designou o Homem para todos os reinos espirituais.
Paz e harmonia sob a nova lei do Amor.
Vimos que quando o Homem chegou, pela primeira vez, na lei do Espírito, recebeu os preceitos do Decálogo: "Eu sou o Senhor teu Deus". Quando chegou na lei do Redentor, recebeu o mandamento de "amar o próximo como a si mesmo"; esta é a chave da obra do Cristo, pois que Homem sob escravidão, não faria tudo a fim de recuperar sua liberdade? Da mesma forma, ele deve fazer todo esforço possível para promover a liberdade do próximo se ele o ama como a si mesmo; se o Homem não ama o próximo como a si mesmo ele não é iniciado no espírito do Redentor que sustentou o amor a ponto de se lançar ao abismo em que nos encontrávamos para nos arrancar de lá consigo.
Ainda que de uma forma limitada, podemos executar aos nossos semelhantes a imensurável obra que o redentor executou a toda família humana ao quebrar os portões de sua prisão e morte diante de seus olhos; ainda é somente através de seu espírito que somos capazes de realizar a parte que nos cabe; se, através do sacrifício de animais, a lei destruiu as influências temporais regulares sobre o Homem; se através da lei profética, a Sabedoria trouxe influências espirituais regulares sobre as nações, nós, através da voz do amor e santidade do Redentor, podemos atrair sobre todos nós as próprias virtudes divinas, com paz, ordem e sagrada harmonia, de acordo com nossa capacidade aqui embaixo.


O aperfeiçoamento de nossas faculdades daqui para frente requer o sacrifício de tudo o que é deste plano.
Quando o revestimento de nossa existência se dissolver, quando o tempo já tiver passado por nós, suavemente, como um rolo de papel pergaminho, iremos apreciar o espírito da vida mais profundamente e beber com o Redentor o sumo fresco do vinho eterno que irá restaurar nossas faculdades em toda sua amplitude, a fim de serem empregadas segundo a sua determinação.
Contudo é em vão que prometemos a nós mesmos tal coisa, se não realizarmos sinceramente todos os nossos sacrifícios neste plano; não somente aqueles pertencentes a renovação pessoal, mas aqueles relacionados a oferta voluntária de todo o nosso ser terrestre e mortal, através de um cuidado diário de nossa parte, a fim de nos tornarmos uma vítima ordenada, sem manchas ou vergonha. Pois, na região invisível que entramos ao deixar este mundo, não encontraremos mais terra para receber os diferentes tipos de sangue, que devemos derramar, necessariamente, para recuperar nossa liberdade; e, se levarmos conosco nossa corrupção, provavelmente contida nestes diferentes tipos de sangue, nada nos restará além do sofrimento e da angústia, já que o tempo e o lugar para o sacrifício voluntário terão passado.
Esta vida é nossa décima primeira hora: trabalhe nela!


Vamos, então, nos preocupar com a vida real; com aquela obra ativa a qual devemos cada instante de nosso tempo e não deixemos de perguntar se haverá alguma futura angústia a temer ou não; tal será nossa preocupação e desejo de retidão.
O crime é a causa destes pensamentos desgastantes e o que leva o Homem ao crime é a inação, através do vazio da mente; o vazio da mente (espírito) joga o Homem no desencorajamento, fazendo-o acreditar que o tempo perdido não pode ser recuperado. Isto, de fato, pode ser verdade com relação a coisas feitas no tempo e para o tempo; mas será válido para o que pertence ao espírito? Não há tempo para o espírito... Não seria possível que um único ato realizado pelo espírito e para o espírito rendesse à alma tudo o que ela falhou em adquirir ou até mesmo tudo o que possa ter perdido pela negligência?
Devemos lembrar da "décima primeira hora", embora devemos também notar que, se aqueles que foram chamados àquela hora, receberam até mais do que sua devida paga, foi porque eles pelo menos trabalharam durante aquela hora, ao contrário, não teriam recebido nada; assim nós também não devemos ter nada a esperar, se, após termos passado as horas antecedentes de forma infrutífera, não completarmos nossa décima primeira hora, realizando a obra do Espírito.
Desde a Queda, só podemos ser meros trabalhadores da décima primeira hora, que, de fato, teve início no instante em que fomos privados de nossos direitos. As dez horas que precederam esta época, estão, por assim dizer, muito longe e perdidas para nós; assim a totalidade de nossa vida terrestre é realmente, para nós, senão a décima primeira hora de nosso verdadeiro e eterno dia, que embarca o círculo universal das coisas. Julgue a partir daí, se temos um momento sequer a perder!


Obstáculos e cruzes são pontos de partida: "Eu te digo, vigiai!"
Ao mesmo tempo, tudo o que é requisito para um desempenho útil e proveitoso na obra desta décima primeira hora, nos é fornecido abundantemente; planos, materiais, instrumentos, nada é retirado de nós. Até mesmo os perigos e obstáculos aos quais nos deparamos e os quais se tornam nossas cruzes quando fugimos deles, são passos e meios de elevação quando superados; a Sabedoria, ao nos expor a eles espera que triunfemos.
Sim, se tivéssemos mantido nosso posto fielmente, o inimigo nunca teria penetrado a fortaleza, por mais poderoso que fosse. Mas, é necessário guardar todas as entradas com tal vigilância constante que, de qualquer forma que ele se apresente, possa nos encontrar alerta e com vigor para resistir. Um único instante de negligência de nossa parte, é suficiente para o inimigo, que nunca dorme, fazer uma brecha, ascender e capturar o indivíduo.
Vamos tomar coragem. Se nossa restauração espiritual requer, na realidade, todo o cuidado, devemos ao menos considerá-la assegurada se resolvermos, pelo menos, assumi-la, pois a enfermidade da alma humana é, se é que posso usar a expressão, apenas uma espécie de transpiração reprimida; o Soberano não cessa de nos administrar sudoríficos poderosos e salutares que tendem incessantemente a restaurar a ordem e a circulação.


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