Os mortos ressuscitados
por Eliphas Levi


O filho da Sunamita - O túmulo de Eliseu Os antigos hebreus acreditavam como os modernos na imortalidade da alma. Moisés no entanto não fez nenhuma menção sobre o assunto no Pentateuco. Esse dogma, com efeito, era reservado aos iniciados, e para reencontrá-lo em todo seu esplendor é necessário penetrar nos santuários da Cabala. Moisés, cuja grande obra era afastar seu povo da idolatria, sabia que a fé mal esclarecida na imortalidade da alma conduzia ao culto dos antepassados e não queria que os hebreus fossem chineses. Não queria que o povo de Abraão e de Jacó levasse do Egito o fetichismo dos cadáveres, não queria dar ao templo do Deus vivo um subsolo povoado de múmias. A conservação dos cadáveres, com efeito, é um ultraje à natureza, porque é um prolongamento artificial da morte. Moisés temia também encorajar a necromancia e parecia prever de longe a epidemia das mesas falantes e dos espíritos espancadores. É perigoso superexcitar a imaginação das multidões, e o cristianismo mais tarde não escapou desse perigo. O sonho do céu fez negligenciar muito a terra , e nunca é demais lembrar que, segundo a palavra do Mestre, a vontade de Deus deve ser feita assim na terra como no céu.

O que está embaixo é como o que está em cima, diz Hemes Trismegisto, e o que está em cima é como o que está embaixo: quando a barbárie está na terra, está também no céu que os homens representam. Tomo por testemunha o fanatismo da Idade Média e o deus dos inquisidores. A religião de Moisés é uma razão sem ternura, e o cristianismo foi de início uma ternura sem razão. É necessário perdoar àqueles que amaram muito. Adorar os mortos que nos são caros é um erro, sem dúvida, mas é um crime imperdoável? Não há mortos para nós, aliás, tudo é vivo. Nossas 33 próprias relíquias, esses restos de ossadas que causam tanto horror ao puritanismo judaico, já não são fragmentos de cadáveres. Reanimadas pela fé comum, regadas por doces lágrimas de esperança, reaquecidas pela caridade de todos, são sementes de ressurreição e garantias de vida eterna. Israelitas, concedei alguma coisa à santa loucura do amor e nos reconduzireis mais facilmente à severidade do dogma pela indulgência da razão! Crer na ressurreição dos mortos é crer na imortalidade da alma. Ora, os hebreus acreditavam na ressurreição dos mortos. Elias ressuscitou o filho da viúva de Sarepta, Eliseu, o da Sunamita, e um morto que lançaram por acaso no sepulcro desse profeta ressuscitou ao contato de suas ossadas. As duas ressurreições, a do filho da viúva e a do filho da Sunamita, parecem muito calcadas uma na outra. Seja o que for, a narração da última contém detalhes de operações magnéticas dignas de serem notadas. O filho da Sunamita morreu de uma congestão cerebral em conseqüência de uma insolação. Eliseu primeiro enviou seu servidor Giezi confiando-lhe seu próprio bastão: Tu o voltarás, disse-lhe ele, na direção do rosto da criança, e tu o farás tocá-lo. Giezi parte com a bengala; mas seja por inépcia, seja por falta de fé, sua operação não produz nada e ele volta sem ter tido êxito. Então, o próprio Eliseu dirige-se ao leito da criança e toma a resolução de reaquecê-lo por incubação e insuflação. Coloca o rosto sobre o rosto da criança, as mãos sobre as mãos dela, os pés sob seus pés; depois, sem dúvida para retomar forças, interrompe e passeia pelo quarto; enfim recomeça sua incubação magnética e a criança retorna à vida. É o que lemos no quarto livro dos Reis.

Dissemos, em nosso Dogma e Ritual da Alta Magia, que uma ressurreição não nos parece impossível enquanto o organismo vital não for destruido. A natureza, com efeito, não realiza nada de repente, e a morte natural é sempre precedida de um estado que se parece um pouco com a letargia. É um torpor que uma grande sacudida ou o magnetismo de uma poderosa vontade podem vencer, e isso explica a ressurreição do morto jogado sobre os ossos de Eliseu. O homem estava provavelmente nesta letargia que comumente precede a morte. Os que o carregavam assustaram-se vendo chegar uma borda de salteadores do deserto e atiraram ao acaso o cadáver no sepulcro aberto do profeta para ocultá-lo dos infiéis. A alma do morto sem dúvida pairava pelas regiões baixas da atmosfera, ainda mal separada de seus despojos mortais; o pavor de sua família comunicou-se simpaticamente com esta alma; ela teve medo de que seus restos fossem profanados pelos incircuncisos e entrou violentamente em seu corpo para elevá-lo e salvá-lo. Sua ressurreição é atribuída ao contato com as ossadas de Eliseu, e o culto das relíquias data logicamente dessa época. É certo que os hebreus, que consideram sagrado o livro onde é narrada essa história, não devem achar ruim o culto que os católicos prestam às ossadas e aos outros restos de seus santos. Por que, por exemplo, o sangue de São Januário teria menos virtude que o esqueleto de Eliseu?