Reino de Jerusalém


Iluminura de um manuscrito de c.1280 com a representação da eleição de Godofredo de Bulhão como Protector do Santo Sepulcro (Histoire d'outremer, Guilherme de Tiro)Assim que a tomada da cidade foi concluída, era necessário estabelecer um governo. A 22 de Julho, um realizou-se um concílio na Igreja do Santo Sepulcro. Raimundo IV de Toulouse foi o primeiro a recusar o título de rei, talvez tentando provar a sua piedade, mas provavelmente esperando que os outros nobres insistissem na sua eleição. Godofredo, que se tornara no nobre mais popular depois das acções do conde de Toulouse no cerco de Antioquia, aceitou o cargo de líder secular, mas com um título mal definido. Raimundo terá ficado desagradado com isto e saíu com o seu exército para acabar por cercar Trípoli.


Talvez tendo em conta a controvérsia que tinha gerado a tomada de Belém por Tancredo de Hauteville, Godofredo recusou-se a ser coroado rei na cidade onde Cristo usara a coroa de espinhos. A exacta natureza e significado do seu título é assim discutível.
Apesar da aceitação geral de que o cruzado bolonhês tomou o título de Advocatus Sancti Sepulchri (Protector do Santo Sepulcro), este título só surge numa carta que não foi escrita por Godofredo. Na verdade, este terá usado o um pouco mais ambíguo termo princeps (príncipe), ou simplesmente mantido o seu título de dux (duque), que já possuía na Baixa Lorena. Roberto o Monge é o único dos vários cronistas da cruzada que afirma que o soberano tomou o título de rei.[1][2]


Esta escolha do título é significante porque é uma forma de afirmar que considerava a Terra Santa, e Jerusalém em primeiro lugar, como propriedade de Cristo, e talvez, por extensão, da Santa Sé. Era assim um posicionamento de servidor e defensor da Igreja. Sendo nominalmente senhor do Santo Sepulcro, este mantinha-se sob a autoridade eclesiástica.
O cargo de Godofredo conferia-lhe as seguintes responsabilidades: com o auxílio dos seus vassalos, guardar Jerusalém e o túmulo de Jesus; distribuir terras aos cavaleiros; conquistar e pacificar as cidades dos arredores; fazer justiça; afirmar a economia local. Também lhe é por vezes atribuído um código de leis dos estados cruzados, chamado de Assizes de Jerusalém.



Gravura ficcional da batalha de Ascalon por C.W. Sharpe (c.1881)Durante a sua curta soberania sobre Jerusalém (cerca de um ano), Godofredo teve que defender o novo reino contra os fatímidas do Egipto, que foram derrotados na batalha de Ascalon em Agosto, depois de os cruzados terem descoberto a relíquia da cruz em que Cristo fôra crucificado. Apesar de quase conseguir conquistar Ascalon, as tentativas de Godofredo em evitar que Raimundo de Saint-Gilles tomasse o domínio dessa cidade resultaram em ela continuar em poder dos muçulmanos, destinada a se tornar num empecilho para o reino no futuro.

 


Em 1100 Godofredo não conseguiu expandir os seus novos territórios através de conquistas. No entanto, a impressionante vitória de 1099 e a subsequente campanha de 1100 forçaram Acre, Ascalon, Arsuf, Jaffa e Cesareia Palestina a tornarem-se seus tributários.
Enfrentou também a oposição de Dagoberto de Pisa, o Patriarca Latino de Jerusalém, que se aliara a Tancredo da Galileia e pretendia estabelecer um estado teocrático. Apesar de os termos deste conflito serem difíceis de determinar com exactidão, Dagoberto deve ter pensado em tornar Jerusalém num feudo do papa, mas não há certezas quanto a esta hipótese.
Godofredo e Boemundo quereriam que Arnulfo de Chocques fosse nomeado Patriarca Latino em vez de Dagoberto, até que terão feito um acordo de que Jerusalém e Jaffa pasariam para a Igreja quando o Egipto fosse conquistado, passando este país a ser o braço secular do reino, com capital no Cairo.

Túmulo de Godofredo de Bulhão na Igreja do Santo Sepulcro, ilustração de 1882ª principal fonte sobre este assunto é Guilherme de Tiro, cujo relato sobre estes eventos é polémico - só ele relatou que Dagoberto obrigou Godofredo a ceder Jerusalém e Jaffa, enquanto que outros cronistas como Alberto de Aquisgrão e Rodulfo de Caen sugerem que tanto Dagoberto como o seu aliado Tancredo tinham feito um juramento a Godofredo, pelo qual aceitariam apenas um dos seus irmãos ou parentes como seu sucessor.
Qualquer que fosse a exacta natureza dos planos de Dagoberto, estavam destinados a fracassar. Uma vez que estava em Haifa quando o Protector do Santo Sepulcro morreu, não conseguiu fazer nada para evitar que os apoiantes da monarquia secular tomassem o poder e exigissem que Balduíno de Bolonha assumisse a liderança do reino. Assim, o patriarca foi obrigado a coroar Balduíno como o primeiro Rei Latino de Jerusalém a 25 de Dezembro de 1100.


Godofredo de Bulhão morreu a 18 de Julho de 1100. Segundo o cronista árabe Ibn al-Qalanisi: "Enquanto se encontrava a cercar a cidade de Acre, Godofredo, o governante de Jerusalém, foi atingido por uma flecha, que o matou". As crónicas cristãs não mencionam este fim; Alberto de Aquisgrão e Ekkehard de Aura escrevem que o Protector do Santo Sepulcro adoeceu em Cesareia em Junho de 1100. Posteriormente, pensou-se que o emir desta cidade o tinha envenenado, mas não parece haver fundamento para este rumor. Guilherme de Tiro não menciona nada disto. Também há a tradição que conta ter morrido depois de comer uma maçã envenenada. Qualquer que seja a hipótese correcta, terá morrido em Jerusalém após doença prolongada, depois de regressar de uma expedição contra o sultão de Damasco.