Ninguém pode fugir dos males como pecados, até ao ponto de ter interiormente aversão por eles, a não ser por combates contra eles.

Por
Emanuel Swedenborg


92. Pela Palavra e pela doutrina tirada da Palavra, qualquer um sabe que o próprio do homem por nascimento é mal, e que daí é que, por uma concupiscência inata, ele ama os males e é levado a eles, de modo que quer vingar-se, quer fraudar, quer difamar e quer adulterar. E, se não considera que tais coisas são pecados e, por esse motivo, não resiste a elas, ele as pratica todas as vezes que a ocasião se apresentar e a sua reputação não sofrer em relação à honra ou ganho. Acresce que o homem as pratica por prazer, se não houver religião nele.
93. Como esse próprio do homem constitui a primeira raiz de sua vida, vê-se qual árvore seria o homem, se essa raiz não fosse extirpada e uma nova raiz não fosse implantada: seria a árvore podre que deve ser cortada e lançada no fogo, segundo o que se diz em Mateus 3:10; 7:19. Essa raiz não é extirpada e uma nova não é colocada em seu lugar, a não ser se o homem considerar os males que formam essa raiz como danosos para sua alma, e queira, em razão disso, desviar-se deles. Mas como eles pertencem a seu próprio e, portanto, são prazeres, ele não pode desviar-se deles senão como contra si próprio, com luta e, assim, com combate.
94. Todo homem que crê que há um inferno e um céu, e que o céu é uma eterna felicidade e o inferno uma eterna infelicidade, e crê que para o inferno vão os que praticam os males, e para o céu os que praticam os bens, esse homem combate. E quem combate opera pelo interior e contra a concupiscência mesma que constitui a raiz do mal. Porque aquele que combate contra alguma coisa não quer essa tal coisa, e cobiçar é querer. Daí é evidente que a raiz do mal não é tirada senão pelo combate.
95. Quanto mais, pois, alguém combate e, assim, afasta o mal, mais o bem toma o lugar do mal, e mais vê, pelo bem, a face do mal, e então vê que é infernal e horrendo. E, por ser tal, não só foge dele, mas também o tem em aversão e finalmente o abomina.
96. O homem que combate contra os males não pode deixar de combatê-los como por si próprio, porque aquele que não combate como por si mesmo, não combate, mas é qual um autômato que nada vê e nada faz; e, de conformidade com o mal, pensa continuamente a favor do mal e não contra o mal. Mas cumpre bem saber que só o Senhor é Quem combate no homem contra os males; ao homem somente parece que combate por si mesmo, e o Senhor quer que isso assim pareça ao homem porque, visto que, sem essa aparência, não há combate e, por conseguinte, não há reforma.
97. Esse combate não é grave senão para aqueles que soltaram todos os freios às concupiscências e a elas se entregaram de propósito, e também para os que repudiaram com obstinação as coisas santas da Palavra e da Igreja. Mas para os outros não é grave. Que eles resistam aos males na intenção, ao menos uma vez por semana, ou duas vezes por mês, e perceberão uma mudança.
98. A Igreja cristã é chamada de igreja combatente, e ela somente pode ser chamada combatente contra o diabo, assim contra o que procede do inferno; o inferno é o diabo. Esse combate é a tentação que o homem da Igreja sofre.
99. Desses combates contra os males, que são as tentações, trata-se em muitas passagens da Palavra. São entendidos por estas palavras do Senhor:
"Eu vo-lo digo: Se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, ele permanece só; mas se morrer, produz muito fruto." ( João 12:24).
Também por estas:
"Qualquer que quiser vir após Mim, renuncie a si mesmo, e tome a sua cruz, e siga-Me. Qualquer... que quiser salvar a sua alma, perdê-la-á, mas quem perder a sua alma por causa de Mim e por causa do Evangelho, esse a salvará." (Marcos 8:34,35);
pela "cruz" se entende a tentação (como também em Mateus 10:38, 16:24, Marcos 10:21, Lucas, 14:27); pela "alma" se entende a vida do próprio do homem (como também em Mateus 10:39, 16:25, Lucas 9:24, e sobretudo em João 12:25), a qual é também a vida da "carne", que "para nada aproveita." (João 6:63). É dos combates contra os males e das vitórias sobre eles que o Senhor fala a todas as Igrejas no Apocalipse. À Igreja de Éfeso:
"Ao que vencer, dar-lhe-ei a comer da árvore da vida, que está no meio do paraíso de Deus." (Apoc. 2:7).
À Igreja em Smirna:
"O que vencer não receberá dano da segunda morte". (Apoc. 2:11).
À Igreja em Pérgamo:
"Ao que vencer dar-lhe-ei a comer do maná escondido, e dar lhe- hei um seixo branco, e no seixo um novo nome escrito, o qual ninguém conhece senão aquele que o recebe." (Apoc. 2:17).
À Igreja em Tiatira:
"Ao que vencer e conservar até ao fim as Minhas obras, dar-lheei poder sobre as nações; e estrela matutina." (Apoc. 2:26,28).
À Igreja em Sardes:
"O que vencer será vestido de vestes brancas, e não riscarei o seu nome do livro da vida; e confessarei o seu nome diante de Meu Pai e diante dos Seus anjos." (Apoc. 3:5)
À Igreja em Filadélfia:
"A quem vencer, fá-lo-ei coluna no templo de Meu Deus, e escreverei sobre ele o Nome de Deus, e o nome da cidade de Deus, a Nova Jerusalém, que de Deus desce do céu, e o meu novo Nome." (Apoc. 3:12).
À Igreja em Laodicéia:
"Ao que vencer, dar-lhe-ei que se assente comigo em Meu trono." (Apoc. 3:21).
100. Desses combates, que são as tentações, vide o que se tratou especialmente na Doutrina da Nova Jerusalém, publicada em Londres, no ano de 1758, ns. 187-201; de onde vêm e quais são, ns. 196, 197; como e quando se efetuam, n. 198; que bem produzem, n. 199; que o Senhor combate pelo homem, n. 200; dos combates ou tentações do Senhor, n. 201.